Assim que entraram no carro, o chefe de Marcos tratou de ligar o rádio para acompanhar as notícias sobre o atentado. Os dois ouviam mudos uma bancada de especialitas debatendo sobre as motivações do ataque. Marcos só conseguia pensar em como a rádio tinha encontrado especialistas em ataque terrorista para comentar em meia hora.
- Tudo indica que se trata de um radical religioso. -defendia um.
- Isso é preconceito! - rebatia outro especialista - Não podemos presumir algo nesse sentido sem investigar direito. A meu ver o incidente foi arquitetado por um grupo organizado!
- Um grupo de fanáticos religiosos organizados, ora! - rebatia outro.
Marcos não via o menor sentido nesse debate.
- No quê eles estão se baseando para falar essas coisas? Do que eles já tem certeza? Não quero saber disso, quero saber dos feridos, se morreu alguém... -reclamou Marcos, impaciente.
- O povo dessa rádio é desse jeito... Não sabem dar a notícia sem opinar. Eu não sei de onde tiraram que tem alguma coisa a ver com religião, agorinha estavam dizendo que uma gangue armada fez o ônibus parar. - comentou o chefe.
Marcos pensou no terror que as pessoas certamente passaram dentro do ônibus. Pensou em como ele teria reagido se estivesse lá. Talvez pudesse ter salvado Julia. Não... Provavelmente só teria percebido o ataque quando o ônibus já estivesse em chamas. Provavelmente estaria morto a essa hora.
A imaginação de Marcos foi interrompida pelo som das buzinas que se multiplicaram de repente.
- Puta que pariu! Agora ninguém anda nessa porra mais!
- Que monte de carro é esse? Em pleno sábado?
- Eu não devia ter passado por aqui, a merda toda aconteceu alí perto da praça... O trânsito deve estar travado por causa disso. Agora sim! Agora fudeu!
Marcos olhou para trás e uma longa fila de carros já se formava. Estavam travados, não podiam mais sair dalí enquanto o trânsito não se resolvesse. Marcos se sentiu culpado pelo incômodo que estava causando na vida do chefe.
- Marcos, eu acho que não vamos sair daqui tão cedo. Talvez você quer descer e pegar um moto-taxi pro hospital... você tem dinheiro aí? - disse enquanto se ajeitava para pegar a carteira.
- Na verdade já estamos perto do hospital, não? Acho que daqui são uns quatrocentos metros. Eu vou a pé.
- Certeza?
- Sim... Acho que vai ser mais rápido até. Obrigado por me trazer até aqui e boa sorte. - Marcos foi desembarcando enquanto falava.
- Boa sorte pra você também! Me dê notícias da moça, Deus a proteja.
- Amém.
Marcos demorou alguns segundos para se orientar. Não estava certo de que direção deveria tomar para chegar ao hospital mais rapidamente. Não sabia se devia mesmo ir ao hospital. O que ele diria? O que ele responderia quando perguntassem o que ele era de Julia? E a moça que mandou mensagem... Como se chamava mesmo? Será que ela pediu a opinião de Julia antes de mandar mensagem para ele?
Marcos sentiu a cabeça pesar. Ele não sabia se devia ir ao hospital mas pensou que era melhor continuar indo enquanto se decidia. Quando chegou na porta e já não podia mais adiar a decisão de ir ou não ao hospital, resolveu que se voltasse atrás naquele momento seria muito pior. Se sentiria culpado. Entrou.